Há tanta
polêmica sobre o assunto hoje em dia que resolvi também dar minha opinião. Um museu expõe um homem nu interagindo com crianças e, quando a
“obra” é criticada, os defensores acusam esses críticos de não entenderem nada
de arte.
No entanto,
não há uma definição clara sobre o que é arte. Na antiguidade, foi criada uma
divisão das artes em tipos de acordo com suas aplicações. Assim, a primeira
arte seria a música, que explora o som; a segunda, o teatro, incluindo aí a dança,
por explorar o movimento,; a terceira, a
pintura, que explora a cor; a quarta, a escultura, explorando o volume; a
quinta, a arquitetura e a exploração do espaço; e, por fim, a sexta, a
literatura, exploradora da palavra.
No século
passado, Riccioto Canudo escreveu um manifesto e atribuiu ao cinema o status de
“sétima arte”, por agrupar diversos aspectos das demais. Daí por diante, novas
classificações enumeram a oitava arte como sendo a fotografia; a nona, os
quadrinhos; a décima, os jogos de computador; e a décima primeira, a arte
digital. Não vamos entrar no mérito do valor dessas classificações. Deixemos
isso para outro artigo.
Mas o que
define a arte? Se for somente a exploração da cor, do som, do movimento, do
espaço, do volume e da palavra, então tudo é arte. Nosso caminhar, nossas
conversas, uma ata de reunião, a rua, uma árvore, enfim, tudo que tenha cor,
som, movimento, palavras, volume e espaço.
“Tudo é arte”.
Essa frase é repetida como mantra por alguns que defendem formas
“incompreendidas” de arte. Marcel Duchamp, ao apresentar ao mundo sua polêmica “Fonte”,
abriu a discussão sobre o que é e o que não é arte. A questão é: tudo “é” arte,
ou tudo “pode ser” arte?
Se excluirmos
os usos metafóricos da palavra arte (a arte da guerra, a arte de conquistar
clientes, a arte de ser popular, aquela criança fez arte, etc.) o dicionário
traz, entre outras definições, a seguinte:
“Produção consciente de obras, formas ou
objetos voltada para a concretização de um ideal de beleza e harmonia ou para a
expressão da subjetividade humana.”
É uma
definição bastante vaga e, por isso mesmo, limitada, que exige complementos e
explicações. Como não há uma versão definitiva e inquestionável sobre “o que
vem a ser arte”, então a discussão “tudo é” versus “tudo pode ser” continua
gerando polêmica e discussões. Por exemplo, como fica a dança nessa definição, se a dança não
é obra, nem forma, nem objeto? A produção é arte, mas o produto, não?
Eu venho dar
minha contribuição na tentativa de ajudar a conceituar algo tão abstrato como
arte e separar o joio do trigo.
Se é difícil
criar um conceito, sigamos no sentido contrário e tentemos identificar o que há
de comum naquilo que consideramos arte e naquilo que desprezamos como lixo. Na
região nebulosa entre esses extremos ficam as tentativas de se criar arte, a arte ruim, e outras produções questionáveis.
Para começar,
a arte tem de ser intencional. Os rabiscos de uma criança numa folha de papel
não é arte. As manchas de tinta num avental não constituem arte.
A arte tem
que provocar algum reflexo no senso estético do observador. Ela é feita para
ser vista, ouvida ou sentida de alguma forma e provocar algum tipo de
sentimento no receptor. Esse efeito não precisa, necessariamente, ser a beleza
como reflexo primário da obra. Uma foto de uma pessoa feia pode causar reações
negativas, desgosto, nojo… Mas, indiretamente, a beleza está na capacidade do
artista em captar a iluminação que realça as rugas, em mostrar um sorriso em
meio à miséria, em denunciar o sofrimento a quem vive numa ilha de conforto. A
beleza está em causar a emoção no público, levar a várias interpretações,
propor o questionamento, desde que isso tudo, como já disse, seja intencional.
Assim, uma gravura de uma lata de sopa de tomate, um bidê autografado e
denominado “A Fonte”, ou um desenho de uma praça cheia de bandeirinhas de São
João são formas de arte. Um homem nu se expondo numa sala, não.
Em todo caso,
a arte é um trabalho. E, como tal, exige um esforço do artista. Se não um
esforço físico, como uma escultura de Davi em mármore, pelo menos o esforço
intelectual de chamar o bidê de fonte para provocar questionamento ou reflexão.
Quando não há esforço laboral nem cognitivo na produção da arte, como uma pichação
ou um mero respingar de tinta numa tela, então não é arte.
Pode
acontecer de a arte não ser reconhecida como tal por estar fora de contexto ou
exposta ao público errado. A arte nem sempre é universal. Pode exigir
explicações. Quando se expõe diversas obras das mais variadas origens e formas,
expondo relações sexuais homoafetivas, com animais ou violentas para menores de
idade e sem contextualização, então dois erros foram cometidos: público errado
e falta de explicação. Nesse caso, o que era arte deixa de sê-lo. Vira zona.
Podemos dizer
que transformar uma latinha de refrigerante numa lamparina, um tricô, um
crochê, uma renda, ou uma campanha publicitária bela e emocionante são trabalhos
que possuem mais teor artístico do que muito daquilo que é exposto em galerias,
mesmo que não sejam chamados de arte.
Não basta
dizer que é arte. É preciso reunir essas características:
·
Esforço consciente;
·
Possuir atributos de beleza de forma direta ou
indireta;
·
Promover a crítica, a reflexão ou a admiração;
·
Estar inserida num contexto;
·
Ser destinada ao público correto.
Vejamos se,
com isso, podemos resumir a arte numa definição única.
“Arte é o
produto ou execução de um esforço consciente do artista na intenção de
transmitir uma reação no senso estético de uma plateia adequada e dentro de um
contexto claro, promovendo a crítica, a reflexão ou a admiração da obra.”
Essa
definição parece evitar algumas falhas da definição anterior, e não tenho a
pretensão de tomá-la como definitiva. Estou aberto a comentários,
questionamentos e sugestões.
O que você
considera arte? Se encaixa nessa definição?
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